terça-feira, 23 de setembro, 2014

Fábrica da Fiat nasce no Nordeste com potencial de dobrar produção

As máquinas de construção ainda preenchem a paisagem. Entre caminhões, retroescavadeiras e tratores, elas movimentam e escavam a terra na preparação do terreno para a pavimentação do solo ou a instalação de novas estruturas. Os prédios, porém, estão lá erguidos e os equipamentos industriais, em sua maioria, instalados. E neles, um número razoável de funcionários, mais de 900 pessoas, já trabalha na chamada fase de pré-produção, quando se testam as instalações, afinam-se procedimentos de trabalho e montam-se protótipos dos carros que serão produzidos no local.
Três anos após serem iniciadas, com investimentos de R$ 7 bilhões, as obras do parque industrial da Fiat em Goiana, na Zona da Mata no norte de Pernambuco, estão, enfim, na reta final para a inauguração no primeiro trimestre de 2015, provavelmente em março.

Na sala de reuniões de um prédio que tem servido provisoriamente como sua sede administrativa, enquanto os escritórios definitivos não ficam prontos, Stefan Ketter - o executivo escalado pelo chefe global do grupo italiano, Sergio Marchionne, para comandar in loco a construção do maior projeto da Fiat em anos - chama a atenção para o desenho da fábrica, o "layout de estrela" das linhas de produção, o mesmo da ilustração acima.
Nele, os quatro setores principais de uma grande fábrica de carros - estamparia, soldagem, pintura e, por fim, montagem - se comunicam por uma estrutura central que funciona como a base de controle da produção: o communication center (centro de comunicação), como batizou, em inglês, a empresa. Além de ser o ponto de interligação por onde passa, por esteiras rolantes suspensas, toda a produção da fábrica, esse prédio é a linha de chegada dos carros produzidos no local, onde os automóveis são submetidos ao controle de qualidade do grupo.
A arquitetura compacta traz duas grandes vantagens para a empresa. A primeira está ligada à gestão, já que, ao encurtar distâncias entre comando e chão de fábrica, a montadora ganha agilidade para solucionar mais rapidamente eventuais problemas e acompanhar com maior proximidade o que acontece nas linhas de produção. "Em no máximo dois minutos, o gestor poderá acompanhar os resultados físicos", afirma Ketter ao receber o Valor na nova fábrica.
O segundo benefício envolve potencialidades do empreendimento. A Fiat preservou espaços para eventuais necessidades de expansão da fábrica, que começa com capacidade de produzir 250 mil carros por ano, mas pode dobrar de tamanho se o mercado exigir. Áreas como estamparia e pintura podem, por exemplo, ser expandidas pelas laterais. Ou seja, se levou quase quatro décadas para construir sua segunda fábrica no país, a Fiat, por mais um bom tempo, não terá que se preocupar em buscar outro local para ampliar a produção ao mercado brasileiro.
O momento do mercado é difícil, com queda próxima de 10% no consumo de veículos no país. Mas Ketter ainda aposta em crescimento no longo prazo. Diz também que a crise da indústria no momento em que a Fiat está perto iniciar as operações em Goiana não pegou a empresa totalmente de surpresa. "Consideramos vários cenários [antes da decisão de investir]. Sabemos como são os ciclos dessa indústria", diz.
Da forma como está hoje, a fábrica de Goiana, anunciada como a mais moderna do grupo no mundo, tem flexibilidade para produzir simultaneamente até quatro modelos distintos. Até o momento, a Fiat só confirmou que vai montar três deles, a começar pelo Renegade, da Jeep, marca da controlada Chrysler. Por enquanto, é o único dos modelos com nome revelado pela companhia, mas a montadora não fecha a possibilidade de produzir outras marcas.
Desde o primeiro ano de operação, a produção será destinada tanto ao mercado interno como para exportações a mercados vizinhos na América Latina. Se o câmbio e os custos de produção no Brasil ajudarem, os jipes produzidos em Pernambuco também poderão desembarcar em mercados desenvolvidos, como os Estados Unidos. "Nosso produto estará preparado para atender às exigências desses mercados", afirma Ketter, que é vice-presidente mundial de manufatura da Fiat desde 2008.
Os trabalhos são intensos para que todas as obras do polo automotivo de Pernambuco sejam concluídas até o fim do ano, sobretudo no parque de fornecedores, que deve ser o último a ficar pronto. O objetivo é celebrar a inauguração até março, numa cerimônia repleta de simbolismos. Será a primeira fábrica inaugurada pela Fiat Chrysler Automobiles (FCA), a empresa resultante da fusão entre as montadoras italiana e americana que está prestes a abrir o capital na bolsa de valores de Nova York. Também será a primeira fábrica de automóveis a ser inaugurada pelo governo eleito nas eleições do mês que vem - dentro, aliás, de uma série de montadoras que abrem as portas nos próximos dois anos.
Para completar, o evento também vai marcar o retorno da Jeep ao Brasil após um período de 32 anos, já que, entre os anos 50 e início da década de 80, o lendário jipe Willys foi produzido no país, primeiro pela já extinta Willys Overland e, posteriormente, pela Ford.
Nesse caso, uma coincidência une a história da Jeep no Brasil com o empreendimento da Fiat em Pernambuco. Além de uma fábrica no ABC, o Willys foi, a partir de 1966, montado em Pernambuco, numa linha de produção da Ford em Jaboatão dos Guararapes. Em 2010, quando já produzia apenas autopeças, a fábrica foi comprada pela Fiat e se tornou o embrião de um projeto maior da fabricante italiana no Nordeste.
O gigantismo do parque industrial da Fiat impressiona. Em um terreno de quase 12 milhões de metros quadrados, antes dominado por canaviais, 260 mil metros quadrados são ocupados pela fábrica de carros e uma área um pouco maior, de 270 mil metros quadrados, abriga o parque de sistemistas, onde 16 fornecedores se instalaram em doze galpões para fornecer componentes automotivos considerados estratégicos, como bancos, eixos e chassis. Há ainda um espaço reservado para uma fábrica de motores, projeto de R$ 500 milhões também já anunciado pela companhia. Mas, nesse caso, as obras não começaram e os propulsores serão inicialmente produzidos numa fábrica da Fiat em Campo Largo, no Paraná.
No total, cerca de 4 mil pessoas de 325 empresas de construção trabalham nas obras. Até meados de 2016, quando o complexo estiver a pleno funcionamento, aproximadamente 10 mil trabalhadores vão circular por ele, entre funcionários diretos da Fiat (mais de 3 mil), dos fornecedores (4 mil) e de prestadores de serviços terceirizados (outros 3 mil empregados).
De sua parte nesse contingente, a Fiat já contratou 938 pessoas, todas devidamente trajadas com o uniforme da Jeep. Mais 200 pessoas devem se unir a esse grupo até o início da produção. Após passarem por cursos de aprendizagem industrial do Senai, o treinamento final desse pessoal é feito numa réplica das linhas de produção instalada dentro da própria fábrica.
Valor Econômico - 23/09/2014
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