Tuesday, February 19, 2013

Buffett e 3G compram a Heinz

Começou com um cordial jantar num restaurante na Flórida, nos Estados Unidos, a costura do maior negócio já realizado na indústria mundial de alimentos. No encontro, uma proposta financeiramente sedutora foi apresentada ao presidente do conselho de administração e CEO da Heinz Company, William Johnson. A conversa durou poucas horas e só estavam presentes Jorge Paulo Lemann, Alex Behring, ambos da empresa de investimentos 3G Capital, e Johnson. Mas foi determinante.
Apenas oito semanas depois, a holding Berkshire Hathaway, do investidor americano Warren Buffett, e a 3G Capital anunciaram o acordo para a aquisição de 100% da Heinz. O anúncio foi feito na manhã de ontem.
Dessa forma, os brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira - o trio de sócios que criou a Anheuser-Busch InBev (AB Inbev) e é dono do Burger King - tornaram-se controladores da Heinz, uma das maiores empresas de alimentos dos Estados Unidos, com 144 anos e US$ 11,6 bilhões em vendas anuais.
Em dois meses, Buffett e Lemann organizaram uma operação que surgiu de maneira quase casual. Buffett e Lemann encontraram-se em dezembro num voo e, entre uma conversa e outra, Lemann apresentou a ideia. Buffett, na mesma hora, mostrou-se favorável. Naquela conversa, concordaram que a 3G ficaria com a gestão do negócio, se a ideia progredisse. Buffett disse a Lemann que acompanhava a Heinz, dona do ketchup mais famoso do mundo, "muito de perto", desde os anos 80. Duas semanas após o encontro dos dois empresários, o projeto começou a ser colocado em pé, o que levou mais seis semanas. Foi anunciado ontem. A 3G conduziu toda a negociação, apurou o Valor.
Sócios planejam fechar o capital da Heinz na bolsa de Nova York, seguindo estratégia aplicada no Burger King
Entre as medidas acertadas entre os sócios, está o plano de fechar o capital da empresa na bolsa de Nova York, segundo apurou o Valor com fonte próxima à operação. Isso foi feito com o Burger King, quando os brasileiros da 3G adquiriram o controle da rede em 2010.
"Esse é o meu tipo de negócio e o meu tipo de parceiro", resumiu ontem Buffett, à rede de TV CNBC. Por US$ 28 bilhões, Berkshire Hathaway e 3G Capital adquirem a companhia, com o pagamento de US$ 72,50 por ação da Heinz, o que equivale a pouco mais de US$ 23 bilhões em dinheiro. O restante, US$ 5 bilhões, equivale a dívidas da empresa assumidas pelos investidores. A Berkshire investirá de US$ 12 bilhões a US$ 13 bilhões na aquisição. A operação está sujeita à aprovação dos acionistas da Heinz e autoridades regulatórias dos Estados Unidos, mas deve ser aprovada, dizem analistas.
A transação será realizada por meio de uma combinação de caixa gerado pela Berkshire Hathaway e afiliadas da 3G Capital. As firmas de investimento terão, cada uma, US$ 4,5 bilhões de participação no capital social da companhia. A holding de Buffett terá uma fatia adicional de US$ 8 bilhões em papéis preferenciais. A transação deve ser concluída até o terceiro trimestre deste ano.
Foi uma operação celebrada por analistas. Em relatórios ao mercado, consideraram a aquisição "um negócio fabuloso" para os acionistas da Heinz (o prêmio é de 20% sobre o valor do fechamento do papel no pregão de quarta-feira). Ontem, os papéis da Heinz abriram em alta e fecharam o dia também em alta de 19,87%, para US$ 72,50, o valor ofertado pelos sócios.
Alex Behring (à esq.), da 3G Capital, ao lado de William Johnson, CEO da Heinz
Para a Heinz, o negócio pode ser o atalho para um crescimento mais rápido. E para a 3G, é um negócio que tem a cara dos sócios brasileiros. É que a Heinz pode ser muito melhor do que é - exatamente o que interessa a Lemann, Telles e Sicupira. Não que a empresa seja um problema, mas ela cresce devagar. E o que precisa ser feito pode trazer ganhos rápidos. "A Heinz é muito bem gerida. Mas eles não estão há muito tempo na América Latina, e podem precisar de ajuda em desenvolver esses mercados agora" disse ao Valor a analista Beth Ann Loewy, da corretora Sturdivant & Co.
Segundo relatórios de resultados, a companhia tem crescido, nos últimos três anos, um dígito em média (em 2012, a alta foi de 8,8% na receita). O lucro operacional subiu 5,7% em 2011 e 11,9% em 2012. Um dos pontos dos analistas é que as despesas crescem na mesma velocidade - os gastos têm ficado, nos últimos três anos, em torno de 21% da receita, em média. Analistas ressaltam ainda que a pressão da concorrência afeta a Heinz. Erin Lash, da consultoria Morning Star, diz que a marca Ore-Ida, de produtos como batata frita, tem enfrentado problemas, decorrentes da rivalidade agressiva e da "falta de interesse" dos consumidores nos produtos.
Em linhas gerais, dizem analistas, a Heinz poderia ser mais eficiente. Há melhorias possíveis na distribuição ao varejo e no trabalho a ser feito com as marcas do grupo e, especialmente, numa exploração mais consistente de mercados emergentes.
A expectativa é que a 3G implante seu modelo de gestão, já conhecido em companhias como AB Inbev e Burger King. O comando capitaneado pelos brasileiros deve partir para uma racionalização dos custos, com revisão de gastos internos, implantação de orçamentos base zero e definição de políticas de meritocracia. Nos negócios em que já entrou, a 3G revisou inclusive o impacto de programas sociais. É possível que isso seja revisto na Heinz. Sobre o assunto, a empresa fala pouco, agora.

Behring, cofundador da 3G, disse ontem que era cedo demais para falar em corte de custos. Os novos donos da Heinz não descartam a ideia de utilizar a Heinz como braço de investimento para comprar outras empresas no futuro.
Hoje, a companhia não admite que haverá mudanças na gestão da Heinz, mas para fontes próximas aos sócios, é só uma questão de tempo. Há algumas possibilidades na mesa, dizem essas fontes. O principal cotado para uma função de comando é Behring, que acompanhou todo o processo de negociação. Outro nome comentado ontem no mercado para comandar a Heinz é o de Paulo Basilio, ex-diretor-presidente da holding ALL, da 3G. Fonte próxima à companhia diz que a empresa é "bem tocada", e como a aquisição foi fechada muito rapidamente, ainda não foi possível fazer uma análise detalhada do comando atual.
Publicamente, Johnson, CEO da Heinz, desconversa. "Sou jovem demais para me aposentar", disse ontem, e depois emendou: "Eu espero continuar fazendo alguma coisa". Ele tem 64 anos.
Buffett e 3G têm histórico de investir no setor de consumo. A Berkshire, por exemplo, detém uma fatia de quase 9% na The Coca-Cola Company, além de uma participação de mais de 2% na Procter & Gamble e de 1,4% no Walmart.
Valor
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