segunda-feira, 31 de agosto, 2015

Água engarrafada vira ameaça ao refrigerante

Mary Clare Carley não se lembrada última vez que bebeu água não engarrafada. Ela compra água em supermercados dos Estados Unidos a US$ 1 ou menos de marcas como Crystal Springs ou Great Value. "Se eu não estiver com minha garrafa d'água, eu me sinto incompleta", diz a professora de 34 anos, sentada em uma praça de alimentação na cidade de Atlanta, com sua enorme garrafa.
Apesar dos inconvenientes óbvios - o plástico e o custo extra para algo que sai praticamente de graça da torneira -, a sede por água engarrafada continua crescendo. O volume de água engarrafada nos EUA cresceu 7% no ano passado, o que coloca o líquido no caminho de superar os refrigerantes em 2017, segundo previsões da Beverage Marketing Corp., que monitora o setor.
A Nestlé SA, que tem a Pure Life e a Poland Springs entre suas marcas, vendeu mais água que o volume de refrigerante vendido pela Dr Pepper Snapple Group Inc. em 2014, o que tornou a empresa suíça - e não a Dr Pepper - a terceira maior fabricante de bebidas não alcoólicas nos EUA, segundo a Beverage Digest.
A notícia é ruim para a Coca- Cola Co. e sua principal rival, a PepsiCo Inc., que juntas controlam cerca de 70% do mercado americano de refrigerantes com margens mais altas. Entre 2000 e 2014, o consumo per capita de água engarrafada mais que dobrou no país, para 128,8 litros por ano, enquanto o consumo per capita de refrigerantes caiu de 201,3 litros para 151,1 litros, segundo a Beverage Marketing.
Existem agora centenas de marcas concorrendo num mercado que não existia a apenas alguns anos atrás, deixando às moscas os bebedouros dos corredores e parques.
Na verdade, a Coca e a Pepsi juntas têm cerca de 20% do mercado de água engarrafada. A principal marca da Coca é a Dasani e a da Pepsi, a Aquafina. Mas elas preferiam estar vendendo refrigerantes. Durante os últimos dez anos, segundo a Beverage Marketing, o preço do litro de água no atacado caiu de US$ 0,43 para US$ 0,32, enquanto o litro de refrigerante subiu de US$ 0,81 para US$ 1,07. As vendas de água engarrafada no varejo somaram US$ 18,82 bilhões em 2014, ante US$ 36,87 bilhões para os refrigerantes, estima a firma de pesquisa de mercado Euromonitor.
Questões ambientais desafiam o produto em algumas regiões dos EUA. Pelo menos 18 parques nacionais, incluindo o Grand Canyon e o Monte Rushmore, proibiram a venda de água engarrafada. O produto é mal visto em muitas universidades e, em maio, manifestantes exigiram que a Nestlé pare de coletar água dos reservatórios da Califórnia, que está sendo assolada por uma forte seca. A Starbucks Corp. parou de usar água da Califórnia em sua marca Ethos, mas a Nestlé, não.
A água, porém, está tão na moda que a maioria dos consumidores a compram mesmo com os inconvenientes ambientais. Enquanto isso, dezenas de pequenas marcas de águas especiais voltadas para a faixa de alta renda e com nomes como Real Water, People Water e HappyWater começaram a inundar o mercado. Elas são financiadas por investidores de todos os tipos que tentam obter margens maiores com novos designs de garrafas, minerais exóticos e elaboradas histórias sobre a origem do produto.
O rótulo da marca Eternal é voltado para dentro da garrafa para que os consumidores o vejam através da água, filtrada pelos minerais calcita, quartzito e arenito das Montanhas Allegheny. A tampa da Karma Wellness Water injeta sete vitaminas na água quando se está pronto para bebê-la. Outras "startups" lançaram águas de bétula, de bordo e de cactos. As firmas de private equity Castanea Partners e First Beverage Ventures, unidade do First Beverage Group, da Califórnia, compraram participações na água alcalina Essentia. O Verlinvest, fundo de investimento dos principais acionistas belgas da cervejaria Anheuser-Busch InBev SA, investiram na Hint, uma água aromatizada tão popular na sede do Google em Montain View, na Califórnia, que a Hint mantém refrigeradores próprios lá.
A guerra das águas está só começando. Marcas de água engarrafada gastaram US$ 84,5 milhões em publicidade em 2014. Ainda é bem menos que os US$ 650,6 milhões gastos com propaganda de refrigerantes, estima a Kantar Media. Mas a Fiji Water, que pertence à firma de capital fechado Roll Global, planeja investir neste ano, sozinha, US$ 30 milhões em sua primeira campanha de televisão nos EUA.
A Coca lançou uma nova campanha em que a atriz Jennifer Aniston elogia sua Smartwater destilada a vapor e enriquecida com eletrólitos. A PepsiCo, por sua vez, fez propaganda da Aquafina neste ano pela primeira vez desde 2008.
Parte desse interesse pode ter sido estimulado por um estudo de 2013, financiado pelo setor, que atribuiu várias doenças à água da torneira. Mas boa parte do interesse emana de uma nova obsessão dos consumidores: a hidratação. Em dezembro, uma pesquisa da Mintel revelou que 29% dos entrevistados se "sentiam estranhos" se não tivessem sempre uma garrafa de água com eles. Isso ajudou a Hidrate Inc., uma startup de alunos da Universidade de Minnesota, a captar neste ano mais de US$ 600 mil por meio de um financiamento coletivo no site Kickstarter, dinheiro usado para desenvolver uma garrafa que monitora quanta água o usuário bebe e envia alertas para seu smartphone.
No Brasil, o consumo per capita de água engarrafada cresceu a uma taxa anual composta de 11,7% entre 2008 e 2014, atingindo 69 litros no ano passado, ante 35,5 litros em 2008, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Águas Minerais (Abinam). A produção estimada de água engarrafada em 2014 foi de quase 14 bilhões de litros, pouco mais que o dobro da registrada em 2008, segundo a associação.
Mesmo bem abaixo do consumo dos EUA, o Brasil é o quarto maior mercado mundial de água engarrafada, segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral do Brasil. (Colaborou Eduardo Magossi.)
Valor Economico
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