sexta-feira, 27 de junho, 2014

Negócios no Rio superam expectativas

A frase "Temos Copa" virou mantra para empresários cariocas de comércio e de serviços em três semanas de torneio. Setores de hotelaria, bares e botequins na cidade elevaram projeções de ocupação e de faturamento, e são unânimes em considerar que, em termos de negócios, o fluxo de turistas no evento ultrapassou todas as expectativas. Antes da Copa, a Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio de Janeiro (ABIH-RJ) previa média de ocupação de 80% durante o evento, com perspectiva de 98% nas finais. Essa projeção subiu para 90%, com chance de 100% no fim do mundial. Já o Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SindRio) elevou de 20% para 30% a estimativa de alta no faturamento em bares e botequins para os dias do campeonato.
Na prática, o encantamento do turista estrangeiro com o Rio de Janeiro impulsionou esse cenário, de acordo com especialistas. A Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro (Riotur) já admite que a previsão inicial de 400 mil turistas estrangeiros na capital fluminense nos dias da Copa deve ser ultrapassada - sendo que esse volume já respondia por dois terços do previsto pelo Ministério do Turismo para o número de estrangeiros no país.
"As melhores projeções foram superadas", afirmou o presidente da ABIH-RJ, Alfredo Lopes, ao falar do setor hoteleiro no Rio, com capacidade de 35,8 mil quartos. A explosão de estrangeiros na cidade foi destacada por Lopes. "Normalmente, em alta temporada, 70% são turistas nacionais; e 30% estrangeiros. Essa proporção se inverteu na Copa", afirmou, acrescentando que o turista latino-americano tem muito a ver com esse cenário. "Muitos hotéis já contam com 100% de ocupação em todos os dias de Mundial. Em termos de negócios, é superior a Carnaval e Réveillon", disse, lembrando que, diferentemente dessas datas de alta temporada, a Copa dura 30 dias.
É o caso do Arena Copacabana Hotel, de quatro estrelas, com 135 apartamentos, e 100% de lotação, segundo o gerente-geral da unidade, Douglas Viegas. O executivo concordou com Lopes sobre a "invasão estrangeira" ao Rio e diz que sua marca já estava atenta ao possível retorno desses turistas, no cenário pós-Copa. A rede pediu crédito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para nova unidade, o Arena Leme, e conseguiu em 2013 R$ 29,2 milhões (45% do investimento total) no programa BNDES ProCopa Turismo. "Em 2015, vamos triplicar a capacidade, com dois novos hotéis, o Arena Leme e o Arena Ipanema - este, com recursos próprios", citando empreendimentos nos bairros de mesmo nome na zona sul.
Essa região da cidade foi o foco dos turistas na Copa. Pedro de Lamare, presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares e Restaurantes (SindRio) e da rede de restaurantes Gula Gula notou fenômeno interessante em seu setor: enquanto bares, botequins e padarias contam agora com projeção média de alta no faturamento em torno de 30% no Mundial, o mesmo não se pode dizer dos restaurantes, que chegam a reportar queda de 15% na receita. Esse desempenho é puxado por estabelecimentos no centro, que atendem escritórios na região e amargam queda mais intensa do que a média, devido aos feriados por conta da Copa. Além disso, o perfil de turista estrangeiro do mundial - notadamente homem; e de 20 a 40 anos, segundo Riotur - não é de gastar muito, o que prejudicou restaurantes mais caros.
Entre os favorecidos pela predileção dos visitantes por gastar menos e permanecer na zona sul está o dono do bar El Galeto, Geraldo Pereira, de 50 anos. O estabelecimento fica em Copacabana, na altura da Fifa Fan Fest (festa oficial da Fifa). "Meu faturamento dobrou", disse ele, sem mencionar números. "Está tão lotado quanto na Jornada Mundial da Juventude [JMJ]", acrescentou, citando evento católico que atraiu 3,7 milhões ao Rio em 2013. O atendente de um quiosque ao lado da Fifa Fan Fest, Antonio Cruz, concorda. "Nessa Copa, faço 200 caipirinhas por dia para os 'gringos'", disse.
Embora não contribua para o movimento em restaurantes mais caros, a Copa tem melhorado a imagem do Rio, tanto no Brasil quanto no exterior, o que acende interesse de novos empreendedores para projetos de longo prazo. É o caso do presidente da DZ Negócios em Energia e ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) David Zylbersztajn, que entrou como sócio da casa de carnes Rubaiyat Rio. Com R$ 10 milhões de investimentos, a nova unidade da rede Rubaiyat estreará na capital fluminense em junho. Para Zylbersztajn, há público para restaurantes de tíquete médio elevado na cidade - e a disputa por esse mercado só tende a aumentar nos próximos anos. "E concorrência é bom para todo mundo" afirmou. Ele diz acreditar em continuidade de fluxo expressivo de estrangeiros ao Rio.
A Riotur concorda. Além do previsto em estrangeiros, o Rio contou também com média de 450 mil turistas nacionais, segundo o secretário municipal de Turismo, Antonio Pedro Figueira de Mello. A estimativa de que o evento movimente R$ 1 bilhão na economia do Rio continua de pé e, agora, o foco da empresa é fazer com que esses turistas voltem à cidade. "Nosso planejamento está baseado em três pilares: participação em feiras e eventos, promoção do calendário turístico, e na realização de eventos especiais", disse.
Entre os turistas estrangeiros, o Rio parece ter conquistado desde os de alto poder aquisitivo até os de renda mais baixa. O australiano e dono de uma cadeia de lanchonetes Greg Aobotos, de 38 anos, assistiu aos jogos do Mundial em Curitiba e São Paulo, e fazia o check-in em um hotel quatro estrelas de frente para o mar de Copacabana. "É uma cidade linda, minha preferida até agora, e não senti ser violenta ou perigosa", afirmou. A mesma impressão teve o francês Jean Louis Caussins, 43 anos, que trabalha no mercado financeiro e veio com mais três amigos, direto do Sul da França. "Estamos há dez dias aqui, e adorando. Vamos voltar", afirmou.
Professor de educação física desempregado, o chileno Yerko Urrutia, de 29 anos também pretende voltar, dessa vez com a família. Mas não vai se hospedar em hotéis com estrelas, e sim da mesma maneira que veio à Copa: de "motorhome" (trailer). "A hospedagem é muito cara", afirmou. A mesma reclamação fez o argentino Walter Williams, de 32 anos, bartender, que alugou quarto na comunidade da Rocinha para assistir ao Mundial. "Muito mais barato", afirmou.
A mudança no tom da imprensa estrangeira ao se referir ao torneio e o destaque que o Rio tem recebido na cobertura internacional também contribui para que turistas, notadamente sul-americanos, resolvam ir à capital fluminense mesmo após a Copa ter começado, na análise do economista Mauro Osório, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Eles viram que as previsões catastróficas, de problemas de transportes e até mesmo eclosão de protestos violentos, não se confirmaram", disse.
Já para o professor de Finanças do Ibmec-Rio, Nelson de Souza, mesmo com fluxo de turistas além do esperado, o impacto na economia do Rio pode ser temporário. "Não há garantias de que o fluxo de turistas continue a se elevar da mesma forma após a Copa. Além disso, o turista que voltar pode ser o que gasta menos; vem de carro; e compra em supermercados e não vai em restaurantes", ponderou. "Precisamos esperar para ver."
Valor
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