Wednesday, April 29, 2020

Na nova pandemia, o melhor lugar para uma marca é o de sempre

Os foliões se aglomeravam sob a exuberância dos arranha-céus e a luminescência extravagante da Times Square. Efusivamente, aplaudiram e entoaram em uníssono a contagem regressiva, em meio a tradicional descida da bola que registra os segundos finais do ano que parte, enquanto outro se apresenta. A esperança de um novo começo permeava o ar.
Do outro lado do mundo, porém, o destino já havia lançado os dados. Em 31 de dezembro de 2019, a mais de 11 mil quilômetros distantes da icônica ‘queda da bola’ em Nova York, autoridades chinesas entraram em contato com a Organização Mundial de Saúde (OMS) para relatar um caso misterioso: 41 pessoas haviam sido infectadas por uma doença inexplicável, com sintomas semelhantes a uma pneumonia.
Antes que ao menos tivéssemos a chance de firmar os pés em 2020, o ano já tinha virado de ponta-cabeça. A Covid-19 eclodiu do morcego para, por meio do pangolim (possivelmente), atingir nossa psique coletiva. Nós nos deparamos, então, com uma crise de saúde, seguida rapidamente por um colapso financeiro e, posteriormente, pelo decreto de uma pandemia global. Passamos de um mundo único para esse cenário de diversos países se isolando furiosamente um do outro. Para a maioria das pessoas, o mundo como o conheciam havia mudado — e estava prestes a mudar para as marcas que os serviam.
Há um sentimento crescente entre os gurus do senso comum nos negócios de que, uma vez que o relacionamento consumidor-marca atravesse a prova de fogo de uma pandemia, o branding nunca mais será como antes. É uma opinião da qual não compartilho.
Não há dúvida de que os consumidores terão comportamentos distintos e, quanto mais durar a situação atual, esses comportamentos acabarão se transformando em hábitos. Iremos às compras de maneira diferente, limparemos os ambientes de maneira diferente, mudaremos os jeitos como interagimos e nos divertimos. À medida que novos hábitos se formam, antigas experiências com marcas se transformarão. Bandeiras de varejo, por exemplo, verão uma maior prevalência de modelos de autoatendimento assistidos digitalmente (como compras feitas online e retiradas pelos clientes em um local determinado, do lado de fora das lojas, em um drive-thru acessível à pé). Marcas do setor de viagens serão ameaçadas pelo aumento do número de pessoas confortáveis com a ideia de se conectar apenas remotamente. Escolas e faculdades serão forçadas a encontrar uma solução que contemple modelos alternativos de educação.
Mas, enquanto muitas experiências de marca mudarão, o significado de ser uma marca notória e obsessiva por atender ao consumidor com excelência permanecerá o mesmo. A evolução em experiências não tem nada de novo: o catálogo da Sears era tão entusiasmante no século 19 quanto os aplicativos de realidade aumentada são hoje em dia. Os princípios fundamentais da construção de marca, tão antigos quanto o próprio tempo, transcendem as experiências e começam pela empatia.
O melhor lugar para uma marca nessa crise é junto aos clientes, como um aliado. Um estudo da Forrester, com mais de quatro mil participantes, apontou que o potencial de uma marca para criar valor está ligado, principalmente, à sua capacidade de gerar engajamento emocional; e que o fator mais influente na escolha do consumidor é a competência das marcas em serem prestativas, confiáveis e reconfortantes.
Marcas que fazem dessa parceria com os clientes uma premissa intrínseca aos seus negócios estão sempre prontas para tensões e instabilidades. Tanto em marcas que a tenham inserida em seu DNA quanto em casos nos quais o CMO precise garimpar mais fundo para encontrá-la, a empatia deve sustentar o gerenciamento crítico e contínuo de crises.
A ação guiada pelo propósito é fruto da empatia. A resposta do Walmart logo após o furacão Katrina em 2005, nos Estados Unidos, é considerada a referência máxima em termos de como uma marca deve responder a uma crise. Quando um grande número de pessoas ficou retida na Costa do Golfo, sem acesso a itens essenciais, o Walmart colocou toda a sua incrível infraestrutura em sincronia para oferecer ajuda a quem precisava, mesmo antes que a Cruz Vermelha e a Agência Federal de Gerenciamento de Emergências (Fema) pudessem chegar ao local. O gigante do varejo realizou ações relevantes e notórias sob a convergência de três forças — a natureza singular da crise, as necessidades dos clientes e os recursos únicos e próprios da empresa para fazer a diferença.
Durante esta pandemia, companhias privadas promoveram iniciativas significativas a partir da convergência de situações especificas a cada uma. AB InBev, L’Oréal, LVMH e Tito’s Vodka redirecionaram processos e ajustaram fábricas para a produção de desinfetantes e higienizadores de mãos. A Gap está confeccionando aventais, roupas hospitalares e máscaras. No Reino Unido, a Pret A Manger oferece drinques gratuitos para trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde (NHS).
A pandemia tem colocado o desempenho das marcas sob os holofotes. Embora haja exceções, como a Norwegian Cruise Lines, investigada por enganar os clientes quanto à gravidade da Covid-19 para que pudessem continuar efetuando reservas em seus cruzeiros, as marcas, em geral, estão sendo aprovadas com louvor. Nos Estados Unidos, uma pesquisa da PSB apontou que 88% dos entrevistados acreditam que as marcas tomaram a frente para ajudar no enfrentamento à crise e 92% dos consumidores concordam que são mais propensos a recompensar essas marcas e seus negócios.
À medida que o futuro das marcas se revelará nos próximos meses e anos após a pandemia, as experiências de marca continuarão se adaptando e evoluindo, provavelmente em um ritmo vertiginoso, alinhadas com a inovação tecnológica. Mas algumas coisas ficarão ainda mais firmemente enraizadas, como a relação de confiança, valor e pertinência que conecta um indivíduo a uma marca. Às vezes, é preciso uma pandemia para as marcas perceberem isso.
- Dipanjan Chaterjee
Meio&Mensagem - 28/04/2020
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